quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Agora somos quatro!

Sim, minha gente. Agora somos quatro. Eu, Rodrigo, Bia e um novo bebê que se desenvolve dentro de mim. Que linda é esta vida, apesar de tantas dores e sofrimento. Sim! Linda, abençoada, iluminada. Este bebê é o nosso bebê arco-íris, que após uma longa tempestade em nossas vidas, agora vem colorí-la com amor, fé e esperança. Amor e fé que nunca perdi desde que a Bia se foi. 

Minha filha, espero que esteja orgulhosa de nós. Orgulhosa de ter nos visto tão profundamente desolados, mas firmes, conscientes e convictos de que a vida segue, a nossa missão segue. E foi através do amor que sentimos por ti que foi possível uma nova vida nascer em mim. Engraçado, vida esta que só foi permitida porque você se foi. Ô, minha filha, como você foi generosa. Abriu espaço no universo para um outro ser surgir em nossas vidas. Como sou grata a ti por ter nos escolhido e por ter nos ensinado tanto! Com certeza foi o nosso amor por ti que multiplicou o nosso amor por nós mesmos e cá estamos agora, com nosso baby2 sendo nutrido por mim.

A gravidez deste bebê é transformadora e curadora. Já faz quase 8 meses que a Bia se foi e este bebê chegou como o melhor presente de Natal para nós e nossa família. Quisemos curtir cada minutinho desta benção apenas entre nós e os mais íntimos, pois sabíamos que a torcida por este momento seria imensa e agora podemos dar esta noticia com mais tranquilidade e segurança: nossas vidas continuam. Tudo foi se acomodando, se acalmando, se aquietando. A dor ainda é minha amiga, a saudade minha companheira, as lágrimas minha explosão. Mas tudo encontra o seu lugar, pois a vida é feita de histórias tristes, terríveis, dramáticas, mas também de conquistas, de alegrias, de vitórias. E é lidar com essa magia que nos move! 

É claro que tenho meus medos, traumas e registros triste por tudo que passamos, mas me sinto pronta e completa para esta nova vida que surge e que vem avassaladoramente firme me trazer mais fé, amor e coragem. Agora, somos quatro! :)

terça-feira, 29 de setembro de 2015

O desenho de Gabi

Há pouco mais de um mês, minha sobrinha e afilhada de 8 anos fez um trabalho de inglês na escola o qual tinha que desenhar algo que representasse uma determinada palavra em inglês. A palavrinha dela era "Sad" (tradução: tristeza).

Então, essa garotinha de apenas 8 anos, mas com uma luz e uma sensibilidade incríveis, fez o seu desenho. Ela não desenhou quando caiu da bicicleta, quando se perdeu no shopping ou quando ficou de castigo. Nem quando seu cachorrinho morreu, ou quando seu peixinho morreu, ou quando seu hamster morreu. Ela desenhou que, quando pensava na Bia, ficava triste. 
O desenho de Gabi vem mostrar muito mais do que uma correta interpretação do inglês, mas a interpretação de um sentimento. E isso é a interpretação da vida! Ela entendeu que a priminha falecida partiu e virou um anjinho, sem ninguém contar desta forma pra ela. Ela desenhou que chora com a partida. Ela desenhou que sente por não tâ-la conhecido. Ela desenhou que sofre por mim, pelo tio Rodrigo, pela vovó, pelo vovô, pela mamãe. Ela desenhou aquilo que nem eu sei se conseguiria desenhar tão bem. Desenhou a saudade estampada em suas lágrimas daquilo que ela não conheceu, do que ela não viveu. O desenho de Gabi é a tristeza da dinda ter perdido seu bebê, dela não ter visto seu rostinho nem ter pegado em suas mãozinhas. O desenho de Gabi é a tradução de como ela e todos nós nos sentimos naquele momento, mesmo ela morando há mais de 1.500km da gente. 

Assim como a dinda aqui, ela também está triste. E essa tristeza leva as pessoas a se unirem em resposta à perda, trazendo outros sentimentos à tona: solidariedade, respeito, empatia, generosidade, compaixão. Que bom que o desenho de Gabi retratou a sua tristeza e o seu estado de espírito. Fico feliz em saber que ela está sabendo lidar, já desde pequena, com esta sensação e permitiu que ela se achegasse, a aceitou, a abraçou. Vivenciar a tristeza, seja falando ou através de um desenho, não é fácil para os adultos, imagina para uma criança. Mas ela traz consigo a capacidade da gente dar valor à felicidade e ter esperança de que a gente é capaz de juntar os nossos pedaços e se refazer para ser feliz.

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Nossas Cartas

Estes dias, nossa terapeuta pediu que escrevêssemos uma carta para a Bia, muito especial e carinhosa, ali, naquele momento, naquela sala de terapia, cada um escrevendo a sua e lendo em voz alta após concluída. Então, resolvi lê-las em voz alta aqui também. Boa leitura!

"Bia, minha filha amada e adorada! Tão esperada foste por mim e pelo teu pai que hoje a nossa saudade não cabe no peito. Te gestar foi o maior presente de Deus! Abençoada fui por tê-la tido em meu ventre.
Pouco tempo tivemos juntas, mas nossa convivência iniciou lá quando ainda eras uma sementinha. Daí se foram 42 semanas até o seu nascimento. Pena que Deus te levou tão cedo porque tenho certeza que iríamos fazer muitas coisas juntas. Eu tinha tantos planos pra nós. Tá tudo aqui dentro de mim ainda. As roupinhas que você não usou, o berço onde você não dormiu, o carrinho onde você não andou. O seio que não pode te alimentar, o peito que não pode te ninar. As músicas que não cantei e as historinhas que que não contei. Os remédios e os brinquedos que não te dei. Tudo ficou guardado em meu coração.
Hoje, posso te dizer que és nosso anjinho, nossa estrelinha que ilumina nossos corações. Foste tão abençoada por Ele que tua missão aqui foi breve. Apenas tinhas que viver o que há de melhor (e raro) na humanidade: o amor verdadeiro. O amor que senti por ti, que o papai sentiu por ti, que todos os nossos amigos sentiram por ti.
E foi este amor que me trouxe algo fantástico! A tua missão aqui me mostrou a minha missão aqui. Contigo, aprendi que tenho muito amor pra dar e que muitas pessoas precisam do meu carinho e solidariedade, pois foi isso que recebi desde que tu partiste.
Então, em teu nome e em tua homenagem, quero seguir esse caminho, consciente de que a nossa história juntas pode ajudar muitas pessoas e famílias. E que este amor só veio somar em nossas vidas.
Te amo muito, para sempre te amarei.
Mamãe."

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"Bia, minha filha amada! Foi com muito orgulho e prazer que recebi a notícia da tua mãe, informando que estavas a caminho, que tinha nos escolhido como pais.
Durante todo o período em que estavas sendo formada, dentro da barriga da tua mãe, foste responsável por diversas transformações nas nossas vidas e na vida daqueles que nos amam. por estas transformações, gostaria agora de te agradecer, pois me tornei uma pessoa melhor e mais preparada para me entregar de corpo e alma às pessoas que amo.
Foste, junto com a tua mãe, o melhor dos meus presentes. Criei uma conexão com você no momento em que olhei no fundo dos teus olhinhos que não tem como explicar em palavras. Essa conexão é puro amor que sempre senti por você.
Agora que partisse, ficam as lembranças de todos os momentos que estivesse presente, tanto na barriga da tua mãe, quanto pessoalmente. 
Te amo para o resto da minha vida e te agradeço novamente por teres me escolhido para te acompanhar nesta breve história que vivemos juntos.
Do teu pai que te ama muito,
Papai."

P.S.: Na imagem diz "a melhor vida é a que se tornou possível".

sábado, 5 de setembro de 2015

O que você pode fazer por mim?

Se tem uma coisa para a qual realmente não nos preparamos, é a morte. Ela vem, bate à porta, senta à mesa de jantar e te faz companhia pelo resto da noite. E a gente não sabe bem o que dizer, o que falar, nem como lidar com ela. 

Nestes dois meses de luto, através da imensa rede de solidariedade que se formou, entendi que tem muita coisa que você pode fazer por nós, pelos outros e por si mesmo:

  1. Dê amor. Seja através de uma mensagem, um abraço, um email, um beijo. Apenas dê o seu amor. É a forma mais sincera e simples que você tem de acalentar quem está em luto, mesmo que você nem conheça tão bem esta pessoa. Por medo de tocar na ferida, as pessoas se calam, mas isso é muito ruim porque ficamos sozinhos com a dor.
  2. Não faça perguntas, nem questione o que houve, como foi a perda ou por que aconteceu. Tem perguntas que nem mesmos nós sabemos a resposta e só nos ferem e geram um clima bem constrangedor.
  3. Evite telefonemas. Nas primeiras semanas, você não tem ideia, mas a última coisa que queremos é atender alguém. Mal conseguimos conversar com nosso companheiro, imagina com outras pessoas.
  4. Quando você escrever, abra o seu coração, mas não espere uma resposta ou um retorno. Além de serem muitas mensagens recebidas, na maioria das vezes não temos forças ou disposição para retorná-las. Às vezes dá vontade de só agradecer; outras, dá vontade de chorar e partilhar um longo parágrafo de dor. 
  5. Tome conta da gente. Eu tive a sorte de ter amigos que tomaram conta de mim, do meu marido e dos meus pais e sogros nesta hora de profunda tristeza. As minhas melhores amigas estavam de madrugada ao nosso lado e providenciaram tudo: desde a alta hospitalar e arrumação das malas, até documentação para o enterro, tratativas com cemitério e funerária, comunicado aos amigos, pagamentos e até escolha do caixão. Durante o velório, elas também nos blindaram de qualquer constrangimento ou questionamento. Estavam sempre ali, ao meu lado, quando eu mais precisava. Também tivemos a companhia de amigos que compraram comida, fizeram uma sopa quentinha e nos ancoraram na hora mais difícil: o retorno para casa. Nos deixaram à vontade para entrar, chorar, arrumar nossas coisas, desfazer as malas, chorar, tomar banho, chorar de novo e entrar nos cômodos com aquele vazio inesperado.
  6. Vá à missa. Nunca achei que fosse ser importante, mas esta hora é um reviver a dor e olhar para o lado e enxergar aquelas pessoas queridas, acalenta muito nosso coração.
  7. Reze. Faça a sua oração pela família em luto, não importando a sua crença. E diga que estás em oração por nós, pois isso fortalece a nossa crença de que Ele está olhando e cuidando da gente.
  8. Não faça convites. Compreenda que este é o momento de viver o luto e dar tempo ao tempo. Não insista. Apenas participar a família sobre algum evento já é ótimo, mas entenda que na maioria das vezes não iremos querer sair de casa ou ver alguém.
  9. Respeite o luto. Sabemos que a vida segue, que tudo continua para os outros, mas para quem está em luto, parece que o mundo parou. Então, nos dias seguintes ao acontecido, evite piadas ou assuntos completamente fora de contexto em grupo de whatsapp e afins que nós participamos. Ninguém quer que os outros fiquem tristes e vivam em luto também, mas é uma atitude de consideração pelo momento doloroso que uma pessoa querida está passando. Não finja que isso não aconteceu, agindo como se tudo estivesse normal. As pessoas vivem momentos alegres e tristes juntas. Não apenas os alegres.
  10. Não faça julgamentos. A última coisa que queremos é julgar alguém ou a nós mesmos, apontar o dedo, eleger culpados. Tem coisas que acontecem porque simplesmente tinham de acontecer. E ponto. Na hora certa, tudo vai se esclarecer.

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Prece de 2 meses

Há 2 meses minha filha nascia e vinha para os meus braços.

Há 2 meses eu sou grata por ter sido escolhida por ela pra ser sua mãe e acolhê-la em meu ventre.

Há 2 meses eu agradeço por ter dado à luz a uma estrelinha que veio brilhar em nossas vidas, mesmo que por um breve momento. 

Há dois meses que eu morro de saudade sem fim.

Minha filha, receba esta prece de mim e de todos nós.

(Vídeo com prece na voz de Maria Betania)

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Plano de Parto

Ao longo desta jornada, descobri que muitas mães pouco sabem ou desconhecem sobre várias ocorrências ligadas à gravidez, ao trabalho de parto e ao pós parto. Termos como "vérnix", "aspiração", "cavalinho", "períneo" e até "plano de parto" tem pouco entendimento entre as mulheres. Porém, eu queria ser uma mãe diferente. Além de curiosa, dispunha de tempo e interesse em compreender tudo pelo qual passava e que me esperava. Não queria intervenções desnecessárias ou orientações que favorecessem mais aos médicos do que a mim e à minha filha. Então fui estudar. Aliás, fomos, pois meu marido me acompanhou firme nesta empreitada. Fizemos cursos, exercícios, hidroginástica, leituras especializadas, consultas e até de obstetra eu troquei com 35 semanas para me sentir mais segura e acolhida. Tudo com a única preocupação de melhor bem-estar para nós duas.

Eu me preparei tanto para o nascimento da Bia que também resolvi fazer o meu plano de parto. Ali, eu relatei tudo que eu desejava para aquele momento que descrevi como "o dia mais feliz da minha vida" e por isso queria que ele acontecesse com muito carinho, planejamento, cuidado e atenção de todas as pessoas envolvidas. O meu sonho era ser respeitada e tratada com amorosidade, consciente de ter feito o melhor para a minha filha nascer saudável, rodeada de amor e respeito por ela.

No meu plano de parto, eu gostaria que ela viesse direto para o meu colo e ficasse comigo por mais ou menos uma hora, que ela pegasse meu peito e eu a estimulasse a mamar, criando a conexão necessária nestes primeiros momentos tão importantes da vida dela. E que eu a namorasse por horas. Não queria que a levassem de mim e pedia, se possível, que os primeiros procedimentos pediátricos fossem realizados com ela ainda no meu colo. Também não queria que a aspirassem se não houvesse necessidade. Nada de procedimentos invasivos. Queria que seu cordão umbilical fosse cortado após parar de pulsar e que meu marido, pai dela, o fizesse. Gostaria que fossem realizados nela somente os procedimentos realmente necessários e que ela fosse tratada com muito carinho e delicadeza, pois era nosso bebezinho frágil que acabara de nascer. 

Não queria que dessem banho nela nas primeiras 24h para que permanecesse com o vérnix para sua proteção. E o seu primeiro banho seria dado por mim e pelo Rodrigo. Queria que o pai indicasse a primeira roupinha de nossa filhinha e que fosse levada para ser apresentada aos familiares e amigos. Queria que ela fosse alimentada apenas pelo meu leite, sem nenhuma oferta de outro alimento ou chupeta. Queria que ela ficasse o tempo todo comigo e com o pai dela. E queria, acima de tudo, que ela viesse com toda a saúde possível. Nada disso aconteceu. Nada.


Ela quase não ficou no meu colo após seu nascimento. Ela foi aspirada, seu cordão foi cortado às pressas e não teve tempo de parar de pulsar. Inúmeros procedimentos invasivos foram feitos nela, todos necessários, lógico, mas tão grandiosos diante daquela recém-nascida que chegara em meus braços pequenina e frágil. Ela ficou por muito pouco tempo comigo, sempre quietinha, não chorava, mas seu coraçãozinho batia forte à espera de muitas outras batidas que viriam. Ou não.

Ela não ficou todo o tempo comigo nem com o pai dela, eu mal a tive nos braços, eu mal pude beijá-la. O Rodrigo não indicou sua primeira roupinha, não a vestiu, não a levou ao vidro. Ninguém a levou ao vidro. E isso é uma das coisas que mais me dói. Ninguém a viu com vida, ninguém tirou foto com ela, ninguém a viu do jeito que eu tinha sonhado e planejado.  Nem os avós maternos, nem a sua dinda, nem as amigas da sua mãe. Todos estavam ali, bem pertinho à sua espera, mas sem poderem vê-la. Naquele instante, me dei conta de que iniciávamos uma nova jornada que não havia plano, treinamento ou curso que nos preparasse para o que enfrentaríamos. Ninguém nos disse o que fazer se minha filha tivesse dificuldade de respirar. Ninguém explicou como é ter um filho na UTI. Nunca foi dito como seria se perdêssemos o bebê. Eu não sabia nada. Eu estava sozinha. Eu era só vazio, espera e oração.
  

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

A promessa

Uns meses antes de eu engravidar da Beatriz, meu marido e eu viajamos à Punta del Este e visitamos na beira da praia um santuário de "Ntra. Sra. de la Candelária", patrona da cidade, onde haviam diversas lajotas de preces e gratidão por terem seus pedidos atendidos. Achei aquilo tão bonito naquele local, a céu aberto, em frente ao mar, tudo tão abençoado por Deus, que pensei que realmente nossos desejos poderiam ser concedidos quando feitos assim, diante de tanta natureza e plenitude.

Então, em silêncio, resolvi fazer a minha promessa também. Eu que quase nunca negociei com Deus, do tipo "faça isso que eu faço aquilo", pois sempre achei que o que recebemos é por simplesmente sermos merecedores. Do contrário, nada feito. Porém, pedi que, se me fosse permitido, eu gostaria de engravidar e que este serzinho viesse ao mundo com plena saúde. E só. Em troca, prometi àquela santa que ali me olhava com seu bebê no colo que, se realizasse meu desejo, eu também voltaria com meu bebê no colo e minha lajota, linda, gravada e a penduraria com todo o meu amor, como forma de agradecimento por ter sido ouvida. Pois é, foi muito.


Eu não sei se voltarei à Punta nem sei se visitarei novamente este santuário. Meu marido diz que devemos ir para fazer uma nova promessa. Eu já fico pensando em como seria esse reencontro: talvez eu metesse o dedo na cara dela e dissesse umas poucas e boas. Talvez ficasse quietinha e chorasse muito. Ou talvez eu apenas agradecesse por tudo que me foi ofertado, pela vida que germinou em meu ventre, pelos olhos amendoados que encontraram os meus ao nascer e até mesmo pela partida sutil e precoce. E, mesmo que pouco entendendo, talvez deixasse que sua sabedoria me guiasse para onde devo ir.